segunda-feira, 3 de junho de 2013

INDISCIPLINA NA ESCOLA E A CRISE DE AUTORIDADE DOCENTE: UM OLHAR PSICOPEDAGÓGICO

A psicopedagogia tem como alvo prevenir ou reverter possíveis dificuldades relacionadas a aprendizagem. No trabalho psicopedagógico de intervenção são considerados vários fatores em relação à instituição a ser atendida, desde a comunidade a qual pertence, o histórico da própria instituição, as características estruturais e de gestão, bem como os agentes envolvidos no processo do aprender e do ensinar.
Nesta perspectiva de visão psicopedagógica, que serve como referencial, é que este trabalho tem como fundamento norteador das estratégias de intervenção a realidade da instituição Escola Municipal Iolanda Raulino.
A escolha da instituição acima referida seguiu-se de maneira criteriosa partindo das observações descritas pelo manual de estágio supervisionado em psicopedagogia institucional, onde dois pontos foram fundamentais como: não possuir vínculo profissional com a escola e não ter qualquer parente próximo ou pessoas da intimidade que façam parte do quadro de alunos, professores, funcionários e gestores.
A partir de então, por meio de observações, entrevistas e dados levantados foi possível compreender o seu funcionamento, em termo de aspecto geral e do cotidiano escolar, desde a convivência entre aluno x aluno, professores x professores, alunos x professores, alunos x direção e direção x professores e demais funcionários é que o olhar psicopedagógico. Tomando sentido sobre a realidade encontrada, passa a planejar ações que visem melhorar e ampliar o trabalho da instituição escolar.

Nesse sentido, este trabalho tem como objetivo a amostragem da instituição no período noturno, na modalidade de ensino Educação de Jovens e Adultos - EJA, com relação a situação motivacional dos professores e dos alunos da Escola (PREFIRO NÃO DECLARAR), com o propósito de elaborar ações que visem elevar a autoestima  e o gosto pelos estudos, bem como o interesse proativo dos educadores para dar mais qualidade ao ensino.
A educação, num sentido mais amplo, não deixa dúvida da sua função social, sendo um fator decisivo da hominização e, em especial, da humanização do homem. Os grupos humanos, constituídos culturalmente como tal, elaboraram, ao longo do tempo, instrumentos, artefatos, costumes, normas, códigos de comunicação e convivência como mecanismos imprescindíveis para sua sobrevivência. Esses mecanismos não se fixam biologicamente nem se transmitem através da herança genética. Os grupos humanos põem em andamento processos externos de transmissão para garantir a sobrevivência das novas gerações e de suas conquistas sociais. Esse processo costuma ser genericamente denominado de educação.
A educação não pode ser considerada como um processo linear, mecânico. Pelo contrário, é um processo complexo e sutil, marcado por profundas contradições e por processos coletivos, contínuos e permanentes de formação de cada indivíduo, o que se dá na relação entre os indivíduos e entre estes e a natureza. A escola é o local privilegiado dessa formação porque realiza um trabalho sistemático e planejado com o conhecimento, com valores, com atitudes e com a formação de hábitos. Em muitos momentos a atuação da escola foi associada à função de formar a classe subalterna, o cidadão dócil e o operário competente, por priorizar a dimensão técnica, ensinando álgebra, ciências e outros conteúdos, sem os quais a força de trabalho não seria capaz, supostamente, de desempenhar de forma satisfatória o seu papel na indústria moderna.
A escola é uma instituição extremamente complexa. Sua função tradicional é a de facilitar a inserção do indivíduo no mundo social. O indivíduo deve aprender as formas de conduta social, os rituais e as técnicas para sobreviver. Ao longo do tempo as funções da escola foram sendo ampliadas, passando a abranger outras, tais como: cuidar das crianças enquanto os pais trabalham; socialização, colocando as crianças em contato com outras e ensinando normas básicas de conduta; aquisição de habilidades básicas como ler, escrever, expressar-se, lidar com a aritmética, os conhecimentos científicos; orientação às crianças nos ritos de passagem para a adolescência, visto que é uma fase bastante difícil devido às mudanças biológicas e psicológicas que ocorrem no organismo. Tratando-se de instituição Guirado, 1997, p.34, escreve:

Estamos definindo as instituições como relações ou práticas sociais que tendem a se repetir e que, enquanto se repetem legitimam-se. Existem, sempre, em nome de um ‘algo’ abstrato, o que chamamos de seu objeto. Por exemplo, a medicina pode ser considerada, segundo nossa definição, uma instituição e seu objeto, pode-se dizer, é a saúde. As instituições fazem-se, sempre também, pela ação de seus agentes e de sua clientela. De tal forma que não há vida social fora das instituições e sequer há instituição fora do fazer de seus atores.

Sob este olhar, o objeto da escola é a educação e o conhecimento. É esta instituição que também promove ritos de iniciação de um nível escolar para outro, que às vezes submetem os indivíduos “a provas que servem de seleção para a vida social, que estabelecem discriminações entre elas, pois só as que adquirem as competências estabelecidas pela sociedade serão aceitas”. (FREITAG, 1980, p. 32).
O cotidiano escolar também está marcado pela violência que aparece na forma de segregação, exclusão e indiferença ao outro. No entanto, esses acontecimentos não são produzidos apenas ao nível individual e nem tampouco somente pelos alunos. Essas práticas são moldadas pelos valores, regras e princípios sociais adotados pelos diferentes atores, adultos e jovens, que se fazem presentes no contexto escolar. As diferenças são produzidas socialmente e se vinculam às relações de poder que permitem incluir ou excluir pessoas, demarcar fronteiras, diferenciar entre o nós e o eles. Segundo Arroyo (1995, p. 36):

A educação moderna vai se configurando nos confrontos sociais e políticos, ora como um dos instrumentos de conquista da liberdade, da participação e da cidadania, ora como um dos mecanismos para controlar e dosar os graus de liberdade, de civilização, de racionalidade e de submissão suportáveis pelas novas relações sociais entre os homens.

Os valores sociais invadem a escola e não sendo discutidos educativamente contribuem para a formação de preconceitos. É importante, assim, que analise-se as práticas, valores e informações que são veiculadas no âmbito escolar buscando o desvelamento e não o acobertamento das práticas de discriminação e de intolerância que podem gerar violências entre os adolescentes e jovens no contexto escolar e entre estes e os adultos.
Concordamos com Miguel Arroyo quando, ao abordar a configuração da educação de jovens e adultos e da juventude nesse cenário, afirma que:
(...) o que há de mais esperançoso na configuração da EJA como campo específico de educação é o protagonismo da juventude. Esse tempo da vida foi visto apenas como uma etapa preparatória para a vida adulta. Um tempo provisório. Nas últimas décadas, vem se revelando como um tempo humano, social, cultural, identitário que se faz presente nos diversos espaços da sociedade, nos movimentos sociais, na mídia, no cinema, nas artes, na cultura... Um tempo que traz suas marcas de socialização e sociabilidade, de formação e de intervenção. A juventude e a vida adulta como um tempo de direitos humanos, mas também de sua negação (ARROYO, 2005, p. 21).

A juventude parece conviver com um movimento de ampliação do distanciamento existente entre seus reais interesses e perspectivas e as questões da escola. Se considerarmos a trajetória da instituição escolar, podemos perceber que a escola não se acostumou a interagir com os movimentos da sociedade. Parece caminhar num outro ritmo. A escola, em geral, ainda se fecha em si mesma criando, por conseguinte, um distanciamento cada vez maior de, ao menos, uma parte de seus atores.
Em geral, violência é conceituada como um ato de brutalidade, física e/ ou psíquica contra alguém e caracteriza relações interpessoais descritas como de opressão, intimidação, medo e terror. A violência pode se manifestar por signos ou por símbolos, preconceitos, metáforas, desenhos, isto é, por qualquer coisa que possa ser interpretada como aviso de ameaça, o que ficou conhecido como violência simbólica.
Hoje infelizmente, a violência faz parte do cotidiano do jovem. Muitos deles destacam que ela está se tornando cada vez mais freqüente no seu dia-a-dia e que, muitas vezes, nem se reconhece mais, pequenos atos como violentos. A violência que esses pequenos atos passam a serem considerados normais, devido à sua freqüência, acaba-se banalizando a violência, o que contribui para atitudes de agressão e de desrespeito ao outro, seja por parte do aluno, seja por parte do professor.
No cotidiano escolar as pequenas violências ou as pequenas agressões do cotidiano se repetem sem parar como a falta de polidez, a transgressão aos códigos de boas maneiras ou a ordem estabelecida o que difere da violência das condutas criminosas ou delinqüentes.
No âmbito escolar a violência é atribuída a fatores relacionados à ordem social mais ampla que, no entanto, repercutem na escola, como a exclusão social, a deslegitimação da política e das instituições sociais, as ideologias autoritárias e as dificuldades de definição e percepção do futuro e a identidade social. A violência no contexto escolar também pode ser desencadeada pelos estereótipos dos adultos em relação ao jovem e ao adolescente (SALLES, 1998) e pelos preconceitos, discriminações e estigmas que, embora sejam de origem social, adentram o espaço escolar (SALLES e SILVA, 2008, CAMACHO, 2001)
Somam-se a esses fatores outros mais diretamente vinculados à escola, como a perda da crença na legitimidade da escola e a deslegitimação dos diplomas,  a percepção de que é difícil atingir os objetivos preconizados pela escola como status e ascensão social (BOURDIEU, 1999), a exclusão na convivência escolar.
A indisciplina em sala de aula é, hoje, um fenômeno que vem sendo discutido em nossa sociedade de forma cotidiana, seja em meios acadêmicos, familiares ou pela mídia.
Considerando que a indisciplina ocupa lugar de destaque entre as maiores preocupações pedagógicas, nos sentimos impulsionados a compreender este fenômeno a partir da análise de noções trabalhadas em diferentes autores.
Para Freire (1997) em pedagogia da autonomia diz que, um projeto de escola que busque a formação da cidadania precisa ter como objetivos: tratar todos os indivíduos com dignidade, com respeito à divergência, valorizando o que cada um tem de bom; fazer com que a escola se torne mais atualizada para que os alunos gostem dela; e, ainda, garantir espaço para a construção de conhecimentos científicos significativos, que contribuam para uma análise crítica da realidade.
A indisciplina escolar não envolve somente características encontradas fora da escola como problemas sociais, sobrevivência precária e baixa qualidade de vida, além de conflitos nas relações familiares, mas aspectos envolvidos e desenvolvidos na escola como a relação professor-aluno; a possibilidade do cotidiano escolar ser permeado por um currículo oculto; entre outros.
Portanto, a indisciplina escolar pode ser atribuída a fatores externos à escola e/ou a fatores que envolvem a conduta do professor, sua prática pedagógica e até mesmo, práticas da própria escola que podem ser excludentes. Araújo (2002, p. 232) orienta o caminho a seguir:
Enfrentar as indisciplinas da vida exige dos profissionais da educação uma nova postura, democrática e dialógica, que entenda os alunos não mais como sujeitos subservientes ou como adversários que devem ser vencidos e dominados. O caminho é reconhecer os alunos como possíveis parceiros de uma caminhada política e humana que almeja a construção de uma sociedade mais justa, solidária e feliz. Para isso, as relações na escola devem ser de respeito mútuo, a diversidade de interesses pessoais e coletivos deve ser valorizada, e a escola deve buscar construir uma realidade que atenda aos interesses da sociedade e de cada um de seus membros.

Dessa forma, Araújo (2002) discute que a escola passa a receber sujeitos não homogêneos, provindos de diferentes classes sociais, com diferentes histórias de vida e com uma “bagagem” que, muitas vezes é negada pela escola.
A perspectiva institucional aponta, portanto, alguns indicativos de que a indisciplina está relacionada a problemas oriundos da e na própria instituição, embora não negue a existência de que conflitos externos também intervenham na relação interpessoal na escola.

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